O artigo reproduzido a seguir foi publicado originalmente no Boletim ABCD – Edição º3, setembro/2020.

 

CONCEITOS SOBRE DOPAGEM E ANTIDOPAGEM

*POR JOSÉ KAWAZOE LAZZOLI – presidente da Comissão de Autorização para Uso Terapeutico da Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem (CAUT/ABCD) e especialista em Medicina do Esporte (SBMEE) e em Cardiologia (SBC)

 

Um atleta está sujeito a passar por controle de dopagem ao longo da sua carreira. Habitualmente eles são assessorados por vários profissionais da área de saúde, incluindo médicos, profissionais de educação física, fisioterapeutas e nutricionistas. Chamados de Equipe ou Pessoal de Apoio ao Atleta, eles devem
ter uma ideia muito clara de quais são as substâncias proibidas que eventualmente possam gerar um resultado analítico adverso a partir de um teste.

Em que pese o princípio jurídico da responsabilidade estrita, no qual o atleta é objetivamente responsável por qualquer substância que seja encontrada no seu organismo, independente de intenção, culpa, negligência ou conhecimento de uso, a pessoa de apoio ao atleta pode ter responsabilidades a serem apuradas.

O intuito deste artigo é trazer conceitos e informações para auxiliar os profissionais que atuam com atletas, especialmente os médicos, a prevenirem a utilização acidental de substâncias que possam vir a prejudicá-los diante de um controle de dopagem.

Cabe à Agência Mundial Antidopagem (AMA-WADA) a prerrogativa de atualizar anualmente a Lista de Substâncias e Métodos Proibidos, que entra em vigência em 1º de janeiro de cada ano. A versão original em inglês pode ser encontrada no site da própria WADA . A Lista traduzida para o português está no site da Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem (ABCD).

Conceito de dopagem

Segundo o Código Mundial Antidopagem, dopagem é definida como a ocorrência de uma ou mais violações das regras antidopagem estabelecidas no próprio Código, que também esclarece que a determinação de proibição de
uma substância ou método na Lista se baseia em três fundamentos:

1) Potencial de melhora artificial do rendimento desportivo;
2) Risco para a saúde do atleta;
3) Ser contrário aos valores do esporte.

Quando temos dois desses três fundamentos presentes em uma substância ou
em um método, existe a possibilidade teórica de inclusão na lista.

O conceito de “ser contrário aos valores do esporte” pode dar margem a interpretações subjetivas. No entanto, estes valores estão explicitados claramente no Código Mundial Antidopagem da AMA-WADA e são: Ética, jogo limpo e
honestidade; saúde; excelência no desempenho; caráter e educação; diversão e alegria; trabalho em equipe; dedicação e compromisso; respeito às regras e leis; respeito por si e pelos outros participantes; coragem; e comunidade e solidariedade.

O Controle Em Competição é realizado durante uma competição específica, como, por exemplo, uma partida de futebol ou uma prova de natação. Neste tipo de testagem, é considerado dopagem qualquer substância e/ou método
proibido descrito na Lista.

Já o Controle Fora de Competição pode ser realizado a critério de Federações Internacionais, Comitês Olímpicos Nacionais ou Organizações Nacionais Antidopagem, que mantêm um banco de dados com a localização dos atletas, atualizado periodicamente. Um atleta pode receber a visita de um Oficial de Controle de Dopagem (OCD) a qualquer momento, em sua residência, no seu local de treinamento, trabalho ou durante as férias. É importante lembrar que constitui Violação de Regra Antidopagem a recusa em se submeter a um controle.

A Lista de Substâncias e Métodos Proibidos

Conforme comentamos anteriormente, a Lista de Substâncias e Métodos Proibidos é atualizada anualmente pela AMA-WADA, entrando em vigência em 1º de janeiro e sendo válida até 31 de dezembro do mesmo ano em questão.

A tabela a seguir mostra as categorias de substâncias e métodos proibidos, já na atualização da AMA-WADA para 2020. Exemplos ou maiores detalhes dentro de cada categoria podem ser obtidos mediante a consulta à Lista completa.

Lista de categorias de substâncias e métodos proibidos da WADA

 

Autorização para Uso Terapêutico (AUT)

Um atleta pode utilizar para tratamento médico uma substância que faça parte da Lista da AMA-WADA, desde que tenha submetido ao órgão competente uma AUT e esta tenha sido concedida. Para a obtenção de uma AUT, é necessário que as seguintes situações estejam contempladas:

a) A substância proibida é necessária para tratar uma condição clínica aguda ou crônica, de tal forma que a suspensão ou a não utilização da substância agrave de forma significativa o quadro clínico;

b) A substância proibida pleiteada para uso não pode produzir uma melhora do desempenho físico além da que se esperaria pelo simples tratamento e reestabelecimento do estado normal de saúde do atleta;

c) Não pode haver alternativas terapêuticas – com base em evidências científicas – ao uso da substância proibida. Em outras palavras, se uma substância permitida pode ser utilizada para tratamento de uma condição clínica de um atleta, esta deve ser priorizada; se uma substância proibida for escolhida, esta opção deve ser solidamente justificada, com base em evidências científicas;

d) Que a necessidade para o uso da substância proibida não decorra da utilização prévia, não terapêutica, de qualquer substância ou método proibido pela AMA-WADA;

Os atletas de nível nacional devem requerer a AUT diretamente à ABCD. Os atletas de nível internacional devem requerê-la diretamente à sua Federação Internacional.

Organizadores de grandes eventos desportivos (como Jogos Pan-americanos e Jogos Olímpicos) podem constituir suas próprias Comissões de AUT.

Naturalmente, as solicitações de AUT devem ser acompanhadas por todas as informações clínicas necessárias para o melhor julgamento pela CAUT, não somente por relatos clínicos, mas por resultados de exames complementares e
relatórios médicos, sempre que se mostrarem relevantes. Quanto mais consistente for a documentação médica enviada, maiores serão as chances de sucesso na solicitação.

Conclusão

Um dos princípios da antidopagem é procurar assegurar a manutenção da saúde do atleta e o jogo limpo. Devemos lembrar que o atleta é responsável por todas as substâncias que porventura sejam encontradas no seu organismo. Por esta razão, consideramos que todos os profissionais de saúde que trabalham com um atleta, especialmente os médicos, devam ter no seu cabedal de conhecimentos técnicos o domínio de conceitos básicos de dopagem e antidopagem, sobretudo para evitar o uso acidental ou não autorizado de alguma substância ou método proibido que possa colocar em risco a credibilidade e a carreira do atleta e do profissional que o apoia.