Nas três participações do São José/Colinas Shopping na Liga de Basquete Feminino (LBF), Cris (foto) sempre foi a líder em quadra em todos os momentos. Desde que veio para a cidade, em 2011, ela contribuiu com energia e entrega total para que o time mantido pela Prefeitura desse os primeiros passos e se firmasse na elite da modalidade no Brasil.
Aos 35 anos e duas cirurgias nos joelhos, a armadora resolveu deixar as quadras depois de 27 anos dedicados ao basquete. Na sexta-feira (11 de abril), esteve presente (pela última vez como jogadora) na reunião de encerramento das atividades da temporada, realizada na Secretaria de Esportes e Lazer.
Cris recebeu uma placa de reconhecimento, um cartão com mensagem de agradecimento das colegas e a camisa 78, o número usado com muito orgulho e confiança pela atleta para defender as cores azul e branca. Logo que começou a falar, ela se emocionou quando lembrou do retorno ao Brasil, depois de seis anos na Espanha, e da chegada a São José dos Campos. “Eu tinha o sonho de encerrar a carreira no meu país, mas não é fácil tomar uma decisão dessas.”
No encontro, o secretário de Esportes citou o papel de Cris como exemplo para as demais atletas. “É um legado que fica para as meninas das categorias de base, que têm um modelo em quem se espelhar.” O diretor executivo do São José Desportivo (organização social responsável pela gestão dos dois times de basquete da cidade), Rafael Mota, e o coordenador das equipes joseenses de alto rendimento, Antônio Carlos Silvério, também destacaram a importância da atleta para a evolução da equipe feminina.
Aquela atleta decidida e inabalável ao longo da carreira dessa vez não resistiu às lágrimas. “Eu vivi grandes momentos aqui e recebi um carinho muito grande de São José”, declarou ela, bastante comovida e quase sem conter o choro, em agradecimento aos integrantes da comissão técnica. “Esse time tem tudo para continuar crescendo, e acho que quando ele for campeão eu também vou sentir o gostinho.”
Capitã e líder do time
Com a presença de Cris, o São José/Colinas Shopping, liderado pelo treinador Carlinhos Lima e pelo coordenador Maurício Iannicelli, cresceu nos três campeonatos. A equipe, que ficou em quinto lugar na primeira vez em que disputou o torneio (2011/2012), terminou em quarto na edição seguinte (2012/2013) e em terceiro na atual temporada (2013/2014).
Capitã do quinteto joseense, Cris foi a condutora do grupo nessa caminhada. De personalidade séria e determinada, assumia a responsabilidade de organizar a equipe, na alegria do triunfo e na tristeza quando o sucesso não era alcançado. Pela idade e experiência, era também uma espécie de irmã mais velha das demais atletas. Muitas vezes orientava as mais jovens e assumia a responsabilidade em momentos que requeriam decisão rápida, seja com arremesso certeiro de três pontos ou uma infiltração para fazer a bandeja.
A torcida do basquete feminino joseense, certamente vai sentir a falta da camisa 78 no ginásio da ADC GM, onde o time manda as partidas. Cris escolheu esse número numa referência ao ano em que nasceu, exatamente no dia 02 de novembro, em Piracicaba (SP), filha de pais originários do norte de Minas Gerais.
Com 08 anos de idade, Cristina Sousa de Carvalho, a Cris, começou a praticar basquete na escolinha do BCN, agremiação na qual permaneceu por uma década. Aos 17, ela se mudou para Osasco. Foi quando saiu de casa pela primeira vez. A família entendeu a opção, pois sabia que a jovem atleta tinha maturidade. “Meus pais assistiam os jogos, sempre me incentivavam, mas me davam liberdade.”
A primeira mudança de clube ocorreu quando Cris estava com 20 anos. Ela foi contratada pelo Santo André. Depois foi para o Ourinhos, Americana, São Bernardo, Ponte Preta. Nesse percurso, teve a oportunidade de atuar ao lado da armadora Paula, campeã mundial em 1994 e medalha de prata pela Seleção Brasileira na Olimpíada de Atlanta, em 1996. “Aprendi muito com ela, e foi um prazer poder jogar com uma pessoa de quem eu era fã.”
Brasil, Espanha e família
Tendo passado por equipes femininas tradicionais do Brasil, Cris recebeu o convite para jogar no basquete espanhol quando estava com 26 anos. Lá defendeu clubes de regiões com cultura distinta e até língua própria. O primeiro foi o Cadí la Seu, de Barcelona, na Catalunha. Depois, na capital – Madri -, Galícia e ilha de Mallorca. Pelo esquadrão galego, a brasileira foi campeã e eleita a melhor jogadora da final da segunda divisão, que garantiu ao time a vaga na elite da liga profissional.
No período em que estava no país ibérico, Cris passou por várias dificuldades, desde lidar com o idioma (hoje ela fala fluentemente espanhol e entende o catalão) e ficar longe da família até ter de mudar o estilo de jogo, pois lá predomina jogadas que exigem força e há muita cobrança por resultados. Mas também aprendeu muito e teve a ajuda das amigas que conheceu na modalidade, muitas delas estrangeiras, para poder se adaptar à situação. “Tive a sorte de estar em grupos que me acolheram, e também cresci como jogadora.”
O desejo de voltar ao Brasil coincidiu com a proposta de trabalho em terras joseenses. “Fui muito bem recebida por pessoas que respeitaram minha trajetória.” Aqui ela se adaptou à cidade, levou a equipe a ser referência nos dois campeonatos mais importantes entre as mulheres – o brasileiro e o paulista – e ajudou a trazer mais adeptos para a modalidade. “O basquete feminino está conquistando São José”, afirma.
Contudo, as dores que vinha sentindo fizeram com que Cris decidisse parar. Afinal foram duas operações no joelho esquerdo e uma no direito. Ela entendeu que chegou a ocasião de se despedir das quadras para não sofrer mais lesões. “Eu gosto de estar em alto nível, e não iria me poupar nos treinos.”
Recém-aposentada ela quer curtir a família – pai, mãe, sobrinhos (ela tem irmão único) – em Piracicaba (SP), coisa que há muito tempo não fazia por morar fora. Com dois anos de psicologia, ela também não sabe se volta a estudar. Agora vai aproveitar o tempo livre para rever amigos, ver filmes de ação, e ouvir muita música popular brasileira, o gênero que mais aprecia. Mas o basquete continuará na mente e no coração dela.
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Foto: Tião Martins/PMSJC
Texto: Claudio Ferreira Ribeiro/PMSJC