Campeãs da LBF CAIXA em 2013 com o Sport Recife, Alessandra e Adrianinha são mais duas jogadoras do especial LBF na terra da Copa. Seis anos antes de conquistarem o troféu nacional, a dupla medalhista olímpica em Sydney-2000 atuou em terras russas, defendendo o Hyp Nur Kazan.
Alessandra chegou a Cazã no começo de 2007. A capital do Tartaristão, uma das 85 subdivisões da Federação Russa, recebe quatro jogos da fase de grupos da Copa do Mundo, além de partidas das oitavas e quartas de final. Milenar – sua fundação data de 1005 -, a cidade tem 1,56 milhão de habitantes e fica a 800 quilômetros da capital Moscou – distância relativamente média, dadas as proporções continentais do país.
Era a volta da pivô às quadras, após três meses de afastamento por uma lesão no ombro, sofrida no Mundial do ano anterior no Brasil, que ficou em quarto lugar (a Austrália foi campeã). A estreia não deixou muitas recordações, mas Alessandra lembra que foi em 8 de janeiro, contra o Dynamo Novosibirsk (equipe que Helen e Karla defenderam três anos antes), pela Liga Russa.
Adrianinha chegou no fim daquele mês para reforçar a armação do Hyp Nur Kazan, e sua estreia, em 27 de janeiro, já mostrou que ela seria uma das peças-chave da equipe: saiu do banco para anotar 18 pontos e 6 rebotes numa vitória por 95 a 85.
A chegada das brasileiras injetou novo ânimo na equipe, que antes só havia vencido uma partida em sete jogos. Com boas atuações da dupla – Adrianinha sempre acima dos 10 pontos e Alessandra colecionando duplos-duplos -, o time conquistou novas vitórias, mas não conseguiu encaixar sequências positivas que ofuscassem o começo ruim no campeonato e não avançou aos playoffs. Ainda assim, pode beliscar a 9ª posição na disputa entre o 9º e 12º lugares, terminando a temporada com 11 vitórias em 28 jogos. O título ficaria com o Spartak Moscow, que no ano seguinte contaria com Iziane em seu elenco.
A campanha foi aquém do desejado, mas positiva para a dupla.
“Para mim foi ótima, pois depois da lesão gravíssima que tive, recuperei e joguei em alto nível no único lugar que me aceitou. Eu e a Adriana chegamos num time que tinha ganhado apenas uma na liga. Éramos últimos e terminamos no top 9, numa liga com as melhores do mundo, como Taurasi e Candace Parker”, analisa Alessandra.
“Um campeonato muito bom, com estilo de jogo diferente e boas equipes, como o Ekaterinburg, o Spartak Moscow, com várias estrelas americanas jogando lá”, complementa Adrianinha.
Fisioterapeuta ‘mandingueiro’ e últimos meses sem tradução
Adrianinha relembra algumas passagens curiosas daquele primeiro semestre de 2007.
“Lá tem-se o costume de se fazer sessões em saunas, e tinha um fisioterapeuta da equipe que pegava uns ramos e batia na gente, dizendo que era para circulação, para nossa recuperação. E a gente, sem saber, levava ‘ramada’ nas pernas, nas costas”, recorda.
“Nosso motorista era muçulmano e as vezes ele tinha que parar o carro para fazer a oração dele. Alguns horários ele não podia nos levar para o treino, pois ele ia para a mesquita”, conta a ex-armadora. Boa parte da população cazanita segue o islamismo e a cidade tem uma das maiores mesquitas da Europa, a Col Xarife, que tem capacidade para até 6 mil fieis.
A língua, um dos principais desafios na rotina dos treinos, ficaria ainda mais desafiadora nos últimos meses.
“Nosso time tinha apenas uma menina que falava inglês e o resto só falava russo. Uma coisa que foi muito engraçada foi quando houve uma discussão e ela parou de traduzir para a gente. Os últimos meses da temporada ficamos sem tradução”, lembra Adrianinha. “Eu não tive problemas porque já falava as palavras chaves”, conta Alessandra.
A experiência de vida russa também foi marcante para ambas.
“Me marcou muito por causa do idioma, além de ser um país fascinante pela sua história e cultura. Posso lembrar das longas viagens de trem no meio da noite para ir jogar, carregando o bolsão com roupa térmica e a plataforma coberta de neve”, recorda a pivô que, certa vez em São Petersburgo, fugiu da intérprete para conhecer as estações de metrô da cidade, em sua opinião “umas obras de arte”.
Para Adrianinha, “minha experiência lá foi ótima. Um campeonato muito bom. E ainda tinha outras brasileiras do vôlei, gente do futsal, do Rubin Kazan (equipe de futebol da cidade). Foi um desafio, principalmente porque conheci uma cultura completamente diferente. Foram três meses de neve que não dá pra esquecer. Minha filha começou a andar lá – olha que chique”, diz Adrianinha aos risos.
Infelizmente, a memória iconográfica de Alessandra pelas andanças na Rússia não está no Brasil. As fotos, reveladas em uma época em que as câmeras de celular ainda não eram tão tecnológicas, ficaram em sua casa na Itália, outro país que pode ver o talento das duas em quadra.
O título da LBF CAIXA em 2013, para Adrianinha, “foi muito importante e marcante, porque foi o último da minha carreira. Especial por ser no Brasil e diante de uma torcida grande como a do Sport”.
Alessandra complementou: “Foi uma experiência totalmente diferente, pois foi a primeira vez que joguei em um time com camisa de futebol, com uma torcida fanática e no nordeste. Adorei e, além do mais, é o título que tenho da LBF”.
Seleção, olimpíadas, Itália, Rússia, Sport Recife. A carreira das duas se encontrou várias vezes, atravessando continentes e marcada por muitas vitórias.
“A nossa parceria foi muito boa, pois para um pivô jogar bem ele necessita de um grande armador, além de exímios chutadores”, diz Alessandra.
“Fomos parceiras muitas vezes e ela me ajudou muito na Europa, inclusive me indicou na minha primeira equipe na Itália”, finaliza Adrianinha.