Seleção

OPINIÃO: O BRONZE NA AMERICUP E A NECESSIDADE DA CONTINUIDADE

A seleção brasileira de basquete feminino conquistou a medalha de bronze na AmeriCup 2021 após vitória sobre o Canadá por 87 a 82 na segunda prorrogação.

Foi a mesma posição conquistada na edição anterior do torneio (2019), disputada também em Porto Rico e que teve os mesmos outros dois semifinalistas (Estados Unidos e Porto Rico).

A trajetória da seleção no torneio teve um pouco mais de altos e baixos do que a média mantida desde que o técnico José Neto assumiu o comando da equipe. As duas derrotas sofridas (Canadá na primeira fase e Estados Unidos na semifinal) incomodaram ao reapresentar questões como a dificuldade de concentração nos minutos finais e de reação aos ajustes do adversário. E, de maneira geral, a defesa mostrou menos inspiração que nas competições anteriores.

Deve se considerar que a seleção não se reunia há quinze meses. A preparação foi curta e sofreu o desfalque na maior parte do tempo da presença do comandante da comissão técnica, que estava envolvido com seus últimos compromissos com o clube angolano Petro de Luanda.

A reabilitação na disputa do bronze vinte e quatro horas depois da frustrante derrota para a seleção americana traz a esperança de que a continuidade do trabalho permita à seleção subir mais escadas na sua evolução, o que permitiria o retorno do Brasil às competições internacionais (Mundial e Olimpíada).

A face mais animadora da participação brasileira na AmeriCup foi a estreia de gala de duas jogadoras.

Destaque na NCAA, a pivô Kamilla Cardoso rendeu acima do esperado (9.9 pontos, 8 rebotes e 18.2 minutos por jogo), terminando como a melhor jogadora do Brasil no ranking de eficiência. Com apenas 20 anos, o potencial da brasileira é imenso e o aprendizado com essa experiência inicial na seleção será reforçado na próxima temporada universitária sob o comando da técnica Dawn Staley, treinadora da seleção americana e futura treinadora de Kamilla na Universidade de South Carolina.

A outra desinibida estreante foi a ala Thayná (10.1 pontos, 5.4 rebotes, 2.4 recuperações em 22.3 minutos por jogo) destaque da LSB/Sodiê Doces/Mesquita na LBF. Depois de cravar 22 pontos na partida inicial contra o adversário mais frágil da competição (El Salvador), a ala pareceu um pouco afobada nos dois jogos seguintes (2 pontos em cada), mas nunca deixou de se mostrar como uma presença enérgica em quadra e uma boa defensora. Nos jogos seguintes, reencontrou o caminho da cesta mesmo contra rivais mais poderosos.

Na armação, achei que o padrão do time caiu um pouco nessa competição e o repertório de jogadas pareceu reduzido.

Destaque do time nas competições anteriores, a (ótima) armadora Débora esteve menos inspirada no ataque e menos segura na organização da equipe (6 pontos e 2,6 assistências em 22.9 minutos por jogo), se posicionando muitas vezes na lateral da quadra para tentar um passe direto para Clarissa. Ainda assim, a jogadora teve uma atuação bastante correta na decisão do bronze.

Segunda armadora, Alana mostra uma evolução tremenda em relação a sua estreia com a seleção na edição de dois anos atrás, se apresentando bastante segura e com maior apetite ofensivo (5 pontos, 3.9 assistências em 18 minutos por jogo) que a titular. Mas assim como Débora, me pareceu ainda com necessidades de ajuste especialmente na situação de cinco contra cinco.

Nas laterais, Tainá Paixão (12.4 pontos, 3 assistências em 27 minutos por jogo) voltou a se destacar como tem sido regra nesse ciclo. Voltando à quadra após semanas afastadas da LBF por uma lesão na mão, a ala-armadora serviu como desafogo nos momentos mais críticos. Fora os arremessos, sua presença favorece a movimentação ofensiva do time e o trabalho das armadoras. Acredito que em algumas situações em que ela estava particularmente inspirada, o padrão frenético de revezamento do elenco foi prejudicial. O mesmo vale para Clarissa.

Gostei também da performance da outra ala titular, Patty (9.1 pontos e 21.6 minutos por jogo) apesar de reconhecer que a sua combinação com Tainá é pouco física. Mas é uma jogadora que não se omite: sempre pronta a se entregar ao jogo, seja qual for o adversário, seja qual for o momento. Talvez não por acaso o segundo melhor índice +/- do grupo, atrás apenas de Clarissa.

Jogadora de excelente potencial e vinda de uma ótima temporada em Portugal, Raphaella Monteiro é sempre cercada de expectativas. No jogo inicial, a ala não teve dificuldade em se apresentar (11 pontos, 6 assistências contra El Salvador). No jogo seguinte, contra a Colômbia, já foi possível perceber a atleta com dificuldades tática em quadra e foram apenas cinco minutos. Nos jogos seguintes, Rapha já estava totalmente inibida no ataque e tentando colaborar em outros fundamentos, de maneira que depois da estreia somou apenas 8 pontos em 6 jogos, fechando o torneio com médias de 2,7 pontos e 11 minutos. O Brasil precisa de Rapha em sua plenitude, com uma evolução maior nos arremessos e na capacidade de leitura.

Retornando à seleção depois de uma longa ausência, a ala Tássia teve bons momentos nos jogos contra El Salvador e Venezuela, mas de maneira geral deixou a impressão que ainda sente os momentos em que o jogo é mais físico (3.9 pontos e 10.7 minutos por jogo).

Também estreante, ala Nanny (3.2 pontos, 2,8 assistências em 10.2 minutos por jogo) mostrou muita disposição sempre que foi chamada. É uma jogadora, no entanto, que vive sua primeira temporada no basquete profissional no Brasil depois de anos no universitário norte-americano e terá os próximos anos definidores na sua afirmação.

Não há muito mais o que se dizer sobre Clarissa (13.4 pontos, 7.1 rebotes em 24.2 minutos por jogo), única brasileira incluída na seleção do torneio. É uma jogadora muito completa, versátil e que faz muito bem ao grupo. Em razão das presenças de Érika e Kamilla, muitas vezes atuou distante da cesta e com eficiência. Nos momentos em que era necessário, assumia o garrafão com o brilhantismo habitual.

Mesmo aos 39 anos, Érika (7.1 pontos, 8.9 rebotes em 19.5 minutos por jogo) ainda é uma presença de respeito no garrafão brasileiro. É notável como é a jogadora mais reconhecida e visada, algo que ficou nítido na partida contra os Estados Unidos. Enquanto se mantiver bem fisicamente e disposta, é um nome do qual a seleção não deve prescindir. Acredito, apenas, que essa opção deve fazer com que a seleção traga mais opções para a posição que permitam um real revezamento, ainda mais considerando que dois outros nomes frequentes na lista (Nádia e Clarissa) conviverem nos últimos anos com lesões e a habitual indisponibilidade de Damiris durante a disputa da WNBA. Desde o início do trabalho por questões alheias à comissão (por exemplo: a contusão de Aline Moura no Pan), o Brasil tem tido dificuldades no setor em que é melhor servido e essa fragilidade foi capital na perda da vaga olímpica.

A pivô Mari Dias também foi a atleta menos utilizada pelo Brasil na competição e acho que isso traduz uma certa estagnação em seu jogo (1 ponto e 7 minutos por jogo). A jogadora se colocou como selecionável a partir de boas atuações no Vera Cruz Campinas e parecia se querer posicionar como uma pivô mais móvel, versátil e que investia inclusive na longa distância. Desde a mudança para o Ituano, Mari sofreu certo retrocesso técnico que torço para que se mostre reversível na sequência dessa LBF.

Espero que agora, com a presença de Paula na Confederação Brasileira de Basquete, seja construído um plano de trabalho adequado para o técnico José Neto que permita essa evolução necessária do grupo até a próxima competição. Muito do que havia sido proposto após a perda da vaga olímpico acabou não acontecendo em razão da pandemia.

Uma declaração do auxiliar técnico João Camargo ao site da Federação Catarinense de Basketball parece deixar claro, no entanto, que essa necessidade de evolução está clara para o grupo.

Disse ele: “Eu acredito que o nosso trabalho foi vitorioso, foi um mês muito bom entre preparação e competição contra equipes preparadas e jogamos de igual para igual com todas, isso foi muito produtivo para nós. O que falta para subirmos nessa escala de qualidade, o elenco tem que chegar ainda melhor do que já está, isso foi conversado na avaliação final de forma propositiva e foi bem aceita porque elas sabem que podem fazer ainda melhor. Quando nós vencemos no Pan-Americano foi o suficiente, mas agora já não é mais, temos que procurar que cada atleta assuma o papel de protagonismo no seu clube e, com isso, quando se apresentar na seleção, chegue em um patamar mais elevado e tenho certeza que isso vai ocorrer.”

Que ocorra!

por Bert – Painel LBF

(23 de junho de 2021)







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